segunda-feira, 19 de março de 2012

Adieu

Sou da sociedade,
O palhaço!
O amor esquecido,
O humor apagado.

Vivo a alegrar,
Mas choro a noites de pesar.
Ah, felicidade que não há,
Porque não me aparece?

Porque na porta
Não me bate?
Prometo lhe fazer nota de música,
Prometo cumprir minha parte!

Ah, felicidade,
Quebre as regras da solidão,
Venha, estilhace a minha janela!
Tire-me desta depressão.

Uísque na mão,
Cocaína na mesa.
Salvação?
Ah, que ninguém me impeça!

Um abraço, mundo!
Admito que foi horrível enquanto durou.
Mon amis, adieu!
La réunion sera de l'autre côté

quarta-feira, 14 de março de 2012

Público

Não começou exatamente naquela tarde de maio. Agora que me recordo de
minhas visitas anteriores, convenço-me que já começara assim, aos poucos, cada
vez que eu ultrapassava a velha porteira do sítio. Começou sucintamente, com algumas conversas, talvez. Mas infelizmente,
começou.

Acontece que naquela mesma tarde de maio eu peguei o trem das sete horas
da manhã. A estação vazia, com alguns ecos escalando pelas paredes. Subi as
primeiras escadas escutando desgostosamente o barulho do meu sapatinho.
Presente do Natal passado. Não me lembro exatamente de quem...fora um Natal
barulhento, um Natal de bêbado, enfim. Mas eis que terminei o último degrau e
olhei os dois lados do corredor: chão encerado refletia um quase reflexo meu. O
zelador ainda encerava, teimosamente, uma marca no chão. Um barulhinho
agoniante saia do esfregão. Esfrega, esfrega.
Decidi pelo lado esquerdo,
igualmente encerado, para minha decepção. Encontrei o guichê das passagens,
tipicamente alto demais. Sujo demais. Público demais. A mulher me olhou por
cima dos óculos de bibliotecária, deixou claro sem dizer palavra que eu não
deveria estar ali; a Connie Francis ecoava um pouco distante enquanto eu não
falava nada.
-Uma passagem. Para as sete. O
trem.
Ela bufou e abriu uma gavetinha,
entregando-me um papelzinho. Bufou de novo quando paguei com uma nota de
cinquenta. Depois do troco, preferi não agradecer.
Fui esperar o trem. A estação
continuava vazia. Sentei-me em um banco de madeira e coloquei minha malinha aos
meus pés. Não levava muitas coisas. Seis e quarenta e sete. Já havia lido
metade dos nomes escrito com canivete -ou com chave- no assento, e relado sem
querer em um chiclete embaixo do banco, quando o trem apitou.
Peguei minha malinha e sentei ao
lado de um moço que dormia. Dormiu a viagem inteira. As quatro horas e meia.
Direto, sem se mexer. Ele tinha a pele branca e os cabelos pretos muito bem
repartidos. E ares de aristocrata.
Nunca mais o vi. Mas acredito que
ele continua dormindo. Ou acordou na última parada do trem.

Melodicamente

Quisera eu nascer compositor. E
das mesmas notas fazer sair um turbilhão de olhares. Se soubesse, comporia em
praça pública. Seria caricaturista de sentimentos a preço baixo. Se eu tivesse
nascido compositor comporia toda uma trilha para cada criança que visse, para
cada lágrima que caísse para cada poeta que amasse.
Se fosse eu compositor ficaria
surdo para ouvir da forma mais genuína cada nota. E se eu fosse tocaria pianos
invisíveis e de pianos invisíveis nasceriam pétalas de rosas.
Mas se eu não sou compositor,
quem me dera ter nascido um! Ter fingido ser um! Ser louco e acreditar que
sou...mas ai de mim pobre criança rica. Rica de nada, de espasmos nervosos por
não saber compor sequer palavras. Por não saber sequer do que se compõe seu
próprio eu.
Porque se tivesse nascido
compositor, comporia a mim mesmo. A começar pelo Lá e a terminar por qualquer sustenido. Porque se
tivesse nascido compositor, saberia que nasci para a lua, que nasci com alma e
que sou um motivo a mais para crer na existência de Deus.
Mas se eu o fosse, talvez não
admirasse tanto aqueles que são. Um artista nunca admite seu talento; e se
admite é porque o sente perder. Se eu fosse um compositor não quereria nada
além do que a satisfação de perceber a sincronia de cada nota escrita na
partitura ou nascida na tecla do piano.
Contudo não o sou. Não nasci
sendo e nem com o gene do aprender a ser. Escuto , então, na esperança de não
ser má ouvinte . Escuto na esperança que, de olhos fechados, entenderei os
sussurros baixinhos da letra falada em uma melodia sem voz. Porque alguém disse
uma vez que silenciando um pouco seu interior, é possível entender o interior
do compositor clássico.
Eis que fico com a tarefa de
ourives. E ai de mim pobre ourives, que tenta lapidar em suas próprias mãos o
ouro de uma sinfonia inteira!

Lese

Havia três campinas a céu aberto. Céu azulado e rosa feito
algodão doce. Nas três campinas nós relembrávamos nossa infância. E criávamos
tudo de novo. Tudo outra vez. Na campina nós dávamos as mãos e andávamos três
passos cada, juntos. Ainda me pergunto se não era o céu a campina, e o algodão,
nós mesmos.
Ainda me pergunto se nós não pisávamos no céu. Ou se
pisávamos dentro de nós mesmos. E também
ainda me lembro do silêncio acariciando cada pétala de cada flor, com cada grão
de pólen. E me pergunto se o silêncio não
era nossas mãos, nossos dedos pequenos, macios, infantis, ingênuos. Dedos que
nunca sentiram nada além de...flores?
E quando deitávamos, sentindo as cerdas da grama em cada
centímetro de pele, você com seu vestido de lese azul, ou era eu que vestia o
azul do seu vestido? E quando deitávamos na tarefa banal de ver estrelas, você
me perguntava qual era a banalidade nisso. Eu respondia com toda a sinceridade
do mundo que eu era criança, e ainda não conhecia a banalidade.
E não há nada de errado com isso. Mas se tivesse um piano de
cauda no meio de uma das nossas três campinas, nós nos sentaríamos e tocaríamos com aqueles mesmos dedos pouco
treinados alguma melodia de Beethoven. Não porque é Beethoven seu compositor
preferido, mas por ser Bach forte demais. E qualquer força maior rasgaria seu
vestido de lese azul, o nosso vestido de lese azul.
Mas era azul o céu aberto de algodão. E é azul tudo aquilo
que ecoa no universo: nossas notas no piano da campina, seu vestido de lese e a
minha nostalgia poética. Por que nunca vi seu vestido de lese azul, e nunca me
deitei em nenhuma das três campinas, e nunca toquei piano...e nunca ouvi Bach e
sequer sei quem é Beethoven. Sei apenas que no inverno faz frio e que em algum
momento verei estrelas nos olhos de alguém. E nesse momento saberei que vi sua
alma. E nesse momento saberei que vi uma alma, e poderei contar a todos os
poetas e a todos os filósofos que, sim, eu vi uma alma. E que ela era azul.

segunda-feira, 12 de março de 2012

Chamem-me de verdade
Chamem-me de cavaleiro do amor,
Pois é o que sou na crueldade
Da não mentira que causa dor

Sou o sincero
O feliz e invejado
Lá se vai o enciumado
Desejando a mim apenas mistérios.

Infelizes mistérios de cavernas escuras,
Já não adianta mais, eu enxergo!
O coração acende e ilumina as estruturas
Que se mudam em sintonia com o vero
Com o eu.

Este sou eu
Aos olhos dos passantes:
Convencido!
Arrogante!
Vagabundo!

Mas este sou eu
Ao meu mundo:
Pela própria mente tecido,
Um ser pensante,
Imaginativamente mudo.

Este sou eu,
Modéstia à parte,
Melhor,
Solto,
Feliz,
Longe do frio
Piche social.

Andando sempre,
Sempre em frente.
O Passado não existe,
O Presente é Carpe Diem
O Futuro não existe,
Então que seja;
Carpe Diem
Em tudo,
Para todos!
Felizes os últimos
Se os primeiros tiverem educação.
Fodam-se os últimos,
Somos nós,
Em dupla trabalhamos melhor,
Em dupla começamos a criar um governo
Umas regras aqui
E ali, até todos
Seguirem o que eu digo
E tudo voltar ao que era antes.
Ao que era pior,
Ao que era corrupto,
Ao que era bom para todos.
Ao adeus da Vida boa
Ao adeus da Vida ruim
Ao adeus.
Adeus.