domingo, 24 de julho de 2011

mas ele não era.

sentado em um tamborete alto demais para seu corpinho. alguém suspeitaria ser contra a física sentar em um banquinho dentro de um trem. ele poderia estar em cima do trem, ai sim...
ficou balançando os pés que não alcançavam o chão. A paisagem lá fora não se mexia rápido demais. elas iam despedindo-se juntamente com os acenos dos ramos das árvores.
tirou a gaita engordurada do capote e levou aos lábios, com uma mão só. a outra permaneceu embaixo de uma das pernas, mantendo uma levemente mais alta que a outra. ficou com a gaita na boca mas não soprou.
um ratinho apareceu de um buraco no rodapé do vagão. trazia um violãozinho nas costas. sentou-se com as pernas penduradas na porta do vagão - também penduradas! (sabe-se que era um trem de carga)
arriscou um dedilhado, balançando o rabo com o ritmo do folk. o menino percebeu a sugestão e juntou a outra mão à gaita. juntou e soprou,aí.
as montanhas iam se repetindo, assim como a estrada de terra que corria ao lado do trem, esperançosa de ver alguém à janela do vagão e poder despedir-se com um aceno, em alguma curva que ela mudasse de direção. o moleque e o rato tocaram juntos sem trocar palavras. ao terminar a canção, arrumou o violãozinho no ombro e desapareceu no buraco do trem.
o moleque tencionou segui-lo. chegou a descer, realmente, obstante com esforço. mas não era Alice, e não coube no buraco.
voltou para seu tamborete, que agora parecia mais alto. tentou escalar os pés, inútil.
mas ele não era Alice, e não cresceu. pensou que poderia juntar-se ao maquinista, que tocava a sua gaita sinistramente no cair da noite. mas teria que correr pelo lado de fora...
tirou a gaita do bolso e pousou nos lábios. voltou a soprá-la e teve a sensação de crescer.
mas ele não era Alice, e não cresceu.

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