domingo, 20 de fevereiro de 2011

"Vê como estão sempre me abandonando?"

Ele me olhava com certa insegurança, como se não soubesse o que dizer. Sentado ao meu lado, aquele meu estranho - agora ouvinte - parecia torcer para que a primeira palavra viesse de mim.
"Eu nunca contei minha história a ninguém, mas posso lhe contar, se assim o quiser". Um simples gesto de cabeça indicou-me que sim.
"Pois bem, eu nasci aqui mesmo, em Willmington, em 1950...Ah sim, como eram bons aqueles tempos!...Fazia parte de uma família muito rica e tinha apenas um irmão - alguns anos mais velho que eu - seu nome era Lionel...Ah meu querido, por que será que me abandonou? Trocávamos tantas cartas e hoje, nada!...Quando criança eu tinha muito medo da chuva, então Lionel segurava em minhas mãos e me acalmava. Sempre foi muito corajoso, o meu irmão, ele dizia que um dia seria um herói."
O ouvinte mexeu-se incomodado na cadeira.
"Meu pai passou a maior parte da vida trabalhando, era banqueiro, então - como se para compensar a ausência - nas horas livres, dedicava-se a fazer todas as vontades dos filhos. Sabe que eu nuca visitei o túmulo de meu pai? Não tive coragem de ir ao enterro, nem ao menos sei onde esta enterrado! Na verdade, eu não sei nada do mundo há tempos. Mas essa história eu lhe contarei num outro dia.
Já lhe falei de minha mãe, não é? não? Ah minha mãe era dona de uma beleza singular, era capaz de passar horas em frente ao toucador, se admirando. Era muito afeita ao luxo, a riqueza e tinha pouquíssima paciência com os filhos. Eu e Lionel, na verdade, crescemos criados pelos empregados...Certo dia ela simplesmente desapareceu, sim, arrumou suas coisas e foi embora, nos abandonou...Vê como as pessoas estão sempre me abandonando? Mas eu não a culpo- ela nunca pareceu feliz, a vida de dona de casa era pouco para ela e talvez não amasse meu pai- mas eu não a culpo porque de infelicidade eu entendo bem, só eu sei o quanto sofri quando pensei que ele tivesse morrido...Mas me enganaram, ele continua vivo e sempre me visita, a última vez foi na véspera de minha vinda para cá...Ah, meu Deus, será que ele sabe onde estou?Preciso vê-lo, explicar tudo! Por favor me leva pra casa!Me tira daqui!Não...não me deixe, me ajude! Não vá embora...não!"
Mas meus gritos e meu choro espantaram a única pessoa que podería comprovar minha sanidade. Fiquei, então, sozinha com meus devaneios, assustada com minha própria atitude desesperada.

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