Ou O Conservadorismo
“A tradição de todas as gerações
mortas oprime como um
pesadelo o cérebro dos vivos.”
Karl Marx
A vida de um homem é uma série de conflitos com o que já está posto. Tudo lhe é externamente determinado e, ainda assim, ele é um agente no processo. Esse processo é, no limite da lógica, completamente inegável. As externalidades são tantas e de tantos tipos que o caráter conflituoso do processo é, numa cosmovisão materialista, absolutamente evidente.
O que nos resta é observar o que há de genérico e humano nesse processo, o que vemos nele que está presente numa infinidade de outros processos, em nossas vidas, em nós, no próprio processo que somos: O conflito em si, o conflito entre o ser que, procurando exercer sua vontade, colide contra o status quo, contra o establishment, contra tudo que está e quer permanecer.
A História se dá dessa maneira. As condições materiais novas enfrentam longas batalhas contra as velhas consciências, obsoletas, que procuram manter em pé um castelo de cartas em meio a uma ventania. Mas, em certa escala, é fácil afirmar tais conflitos nos processos sociais, nas amplas esferas da vida. Mas e quando o desafio moderno, científico, e filosófico da generalização se faz presente? Aplicar a mesma lógica às mínimas ações, às relações interpessoais, enfim, a tudo que é particular: essa é uma obrigação da coerência.
Não mais o conservadorismo de uma sociedade, de uma classe, mas sim o conservadorismo de um indivíduo. Não mais o conservadorismo sobre a moral, sobre a religião, sobre a política, mas sim o conservadorismo para a vida particular como a vivemos, para as relações pessoais tais quais as temos ou deixamos de ter.
Muitas vezes nos revoltamos ao ver uma manifestação de conservadorismo social, mas quantas vezes nos enfurecemos diante do conservadorismo individual? Não nos revoltamos, simplesmente. E isso se explica pelo fato de que na esfera individual ainda não aprendemos a enxergar tal conservadorismo e chamá-lo pelo nome.
É evidente quando uma idéia revolucionária se contrapõe a uma idéia reacionária e ambas destilam o ódio mútuo dia após dia. Mas como enxergar o momento em que nossas vidas e nossas relações se tornam obsoletas? Como saber quando nossa consciência está atrasada e estamos, de fato, andando contra a roda da história de nossas vidas? Quando estamos, enfim, somente nos deixando viver e não vivendo, perdendo tempo, perdendo chances? Quem souber enxergar esse momento precisará, ainda, de uma dose de coragem que poucos têm.
Falta, por fim, afirmar a freqüência com que tais momentos se dão. Olhando para o passado todos são capazes de encontrar ações que demoraram mais do que deviam, situações que sobreviveram por puro conservadorismo, falta de atitude. Retrocessos por falta de visão. Covardia.
E, além do mais, quantas vezes não podemos sentir a força do passado a nos infernizar? Quantos dos nossos sonhos são frustrados pela simples objeção de que as coisas estão estabilizadas de uma maneira e não mudarão por bem? Parece, então, que perdemos o momento. Que chegamos tarde demais no mundo, tarde demais em determinado círculo social, que conhecemos aquela pessoa tarde demais. À sombra do mundo errado, murmuramos então um protesto tímido: ‘Se tivesse chegado antes, venceria.’ A tal tímido protesto murmurado, proclamo em alto e bom som um princípio revolucionário: Nunca é tarde demais para tomar as rédeas da própria história.
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